terça-feira, 10 de junho de 2008

Prostituição e Discriminação Social - parte I

Portugal ficou escandalizado quando se descobriu uma rede de tráfico de mulheres faz uns anos atrás. As mulheres eram raptadas no Algarve e levadas para Espanha onde eram obrigadas a prostituir-se em casas de alterne. Algumas mulheres quando se recusavam eram colocadas em arcas congeladoras durante 20 minutos. Não tinham grande hipótese. O escândalo maior foi saber que os culpados receberam penas leves pelos crimes cometidos e que, 2 ou 3 anos depois, andavam cá fora a ameaçar as mulheres que, contra eles, tinham testemunhado.

A nossa lei parece branda contra este tipo de crimes. Infelizmente a nossa consciência social ainda é pior. As prostitutas são excluídas da vida pública e nem tem direito a condições de trabalho minimamente humanas. São mulheres expostas a violações, violência psicológica e depois são esquecidas. É impossível distinguir a mulher que se quer prostituir daquela que é obrigada a prostituir-se. Elas vivem sob o mesmo governo mas numa economia paralela, no mesmo prédio mas numa estrutura social muito diferente.

Várias perguntas se podem levantar quando analisamos o problema da prostituição: o que entendemos por prostituição? Porque é que algumas mulheres se prostituem? Porque é que preferimos relegar as prostitutas para uma condição humana inferior? Terá a prostituição um papel importante a desempenhar na nossa sociedade?

Considera-se prostituição a troca consciente de sexo por outros favores ou interesses que não pertençam ao foro sentimental. Trocar dinheiro por sexo é prostituição, trocar uma promoção por sexo é prostituição, trocar sexo por comida é prostituição. Na realidade mostrar partes intimas do corpo por dinheiro é prostituição. Uma modelo que apareça quase nua num desfile de moda (como é comum) está a prostituir-se, uma actriz ou actor que mostre as suas partes intimas num filme está a prostituir-se, uma mulher que mostre as suas partes intimas num site pornográfico está a prostituir-se. Se o leitor reparou existem muitos tipos de prostituição socialmente aceites.

É evidente que a visão que temos da prostituição depende da sociedade onde nos inserimos. No Antigo Egipto as prostitutas eram divinizadas. As sacerdotizas recebiam presentes em troca de sexo. Na nossa sociedade de padres impotentes as putas são mesmo putas.

Uma mulher que troque sexo por promoções académicas chama-se Sr. Doutora e não puta. Uma mulher que troque sexo por dinheiro é, simplesmente, puta. E qualquer pessoa sabe que as mulheres têm uma tendência enorme para se sentirem atraídas pelo chefe ou pelo macho alfa.

O problema está em separar a troca de sexo por emoções ou por outra coisa considerada mais mundana. A troca de sexo por dinheiro é criticada socialmente como prostituição, mas a preferência de mulheres por homens ricos já não é prostituição. Elas estão apaixonadas. O Cristiano Ronaldo passou de um gajo pobre e feio que nem sabe falar para um sex symbol (continua sem saber falar mas isso não importa). Tirando o dinheiro o que tem o Cristiano Ronaldo? Fez algo de importante pela nossa sociedade? Lutou pela nossa democracia? Luta pelos direitos humanos e é distinguido nessa área? Tem trabalho feito na luta contra a pobreza mundial? É um cientista reputado? É uma pessoa com índices de formação muito bons a quem dá prazer ouvir falar? (lembre-se o leitor que este tipo de coisas são apreciadas pelas mulheres, supostamente).

Pode-se dizer que é extremamente profissional naquilo que faz e as mulheres preferem homens bem sucedidos (o que é uma forma de prostituição). Mas então, porque é que as mulheres não preferem cientistas bem sucedidos (vencedores do Nobel, por exemplo) ou campeões mundiais de ping pong? Bem a resposta é simples: mulheres com altos níveis de formação podem preferir, realmente, o prémio Nobel. A grande diferença, entre este tipo de homens bem sucedidos, é que um deles tem uma projecção social maior (poder) e muito, muito mais dinheiro. Trocar sexo por sentimentos não é prostituição mas o que é trocar sexo por sentimento quando esses sentimentos são facilmente trocados pelo dinheiro? Na realidade a prostituição é uma forma de expressão da sexualidade feminina. Ninguém gosta de admitir isso. Salvo parêntesis para referir que trocar sexo por beleza também pode ser encarado como uma forma de prostituição, coisa muito comum nos homens.

Nós reduzimos a prostituição à ausência de sentimento (ou à suposta ausência de sentimento). Por isso uma mulher que aprecie sexo ocasional com desconhecidos é chamada puta (ausência de sentimento), uma mulher que troque sexo por algo fora da esfera sentimental (mesmo que esse algo seja dinheiro para dar de comer ao filho ou garantir uma formação superior à filha) é puta (ausência de sentimento). Mesmo a mulher pobre que se casa com um homem rico é puta. Mas neste caso é uma puta de bastidores. Ninguém se atreve a chamar-lhe puta em público, uma vez que o seu casamento lhe oferece um estatuto superior.

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